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domingo, 24 de fevereiro de 2013

A lorota das melancias


Os colonos, como prática agrícola, tiveram o princípio da diversificação produtiva. Uma filosofia de não depender dum exclusivo e único produto. Alguma dezena de culturas, ao longo dos lotes, espalharam-se no contexto das lavouras. O fato incluía as tradicionais abóboras, melancias, melões... Elas visavam o auto-abastecimento e mimo familiar.
Um certo morador, próximo a estrada geral (duma vila), cultivara o tradicional aipim. Um produto, junto ao arroz, feijão e alguma carne, ostentava-se a alimentação básica dos cardápios familiares. Os agricultores, sem maiores exceções, trataram de plantá-lo nas localidades afora. Duas centenas de pés, numa família, davam produção suficiente para o consumo anual.
A mandioca, no interior da roça, ganharia a companhia dos “pés” (plantas) de melancia. Esta, com a sombra alheia, adorava a consorciação. As volumosas frutas, numa aparente brincadeira de esconde-esconde, puderam proteger-se da excessiva insolação. O plantador, em intervalos de tempo, percorria o interior da lavoura. Este dava-se a alegria e satisfação de apreciar as belas e excepcionais frutas.
O colonial, com a massiva adubação (do solo arenoso), viu a recompensa do esforço e trabalho. As plantas agradaram-se do mimo e correspondiam as expectativas. A vizinhança, como sua ousada gurizada, deparou-se com as intenções da cobiça e pilhagem. Os malandros, com o amadurecimento das frutas, planejaram incursões noturnas ao local. Estes, a semelhança do proprietário, almejaram degustar uma e outras boas melancias. As volumosas frutas constituiam-se num convite a transgressão.
O roubo de melancias, no círculo colonial, era uma brincadeira e prática costumeira. Os plantadores, na proporção de não danificar/estragar, davam a mínima (com o sumiço de algumas). A abundância e fartura, de maneira geral, nem denunciava a falta de umas e outras. Alguns apreciadores, de boas distâncias, advinham na surdina para incursionar nas lavouras alheias. A prática, no primeiro conchilo do plantadores, acontecia nas caladas do dia e, de preferência, nos finais de semana.
O proprietário, da beira da estrada geral, resolveu assustar e inovar na criatividade e proteção. Este, próximo ao amadurecimento das graúdas frutas, resolveu instalar uma placa. Esta, como aviso geral aos pedestres, continha/dizia: “- O local tem duas frutas envenadas!” Os larápios, em potencial, depararam-se surpresos com o inesperado alerta. Estes, num pré-combinado de semanas, viram-se afrontados e desafiados nas pretenções. A dúvida crucial: Quais seriam as envenadas? A desconfiança certamente recaia sobre as esbeltas e graúdas.
As dúvidas e opiniões, sobre o pré-estabelecido, mantinham-se acirradas e variadas. Um participante, numa altura, sugeriu dar a contrapartida. A turma, numa cortesia/gentileza inoportuna, confecionaram seu aviso. Esta continha o seguinte alerta: “- Agora tem seis envenadas!” O dono/plantador certamente assustou-se com a informação. Quais seriam essas? Algum produto impróprio injetado no interior das frutas.
Os dois avisos, como alerta geral, permaneceram afixadas umas boas semanas. As melancias, de dar água na boca (no sabor dos dias quentes de verão), eram um chamarisco ao apetite e consumo. O pessoal, de maneira geral, temeu a inconveniência. O tempo transcorreu no cenário de boa produção. As frutas, no entanto, apodreceram literalmente no local. Nenhum consumidor ousou arriscar a incorrer numa excepcional indisposição (estomagal e diarreia).
O curioso, no cruzamento posterior das informações, relacionou-se a realidade dos fatos. Os autores descobriram que nenhuma fruta tinha sido contaminada. As partes, numa ingenuidade mútua, ousaram pregar-se uma peça. Uma lástima, de dar dó, o desperdício daquela majestosa dádiva agrícola.
A ganância de uns atrapalha seu próprio bem estar. Quaisquer peças, cedo ou tarde, revertem em auto-prejuízos. As melancias, nas colônias, deram origem a inúmeras histórias e relatos pitorescos. Os doadores, para darem algum bem, devem fazê-lo com carinho e satisfação.
Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”

Crédito da imagem: http://ahortadocouto.blogspot.com.br

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