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domingo, 10 de março de 2013

O debulhador de milho


Um jovem, advindo das colônias, conheceu uma menina da cidade. Estes, em função da educação diferenciada, tiveram acentuadas diferenças culturais e filosóficas. Os coloniais, diante dos modelos urbanos de existência, tem poucas chances de estabelecer relacionamentos duradouros e íntimos. O modelo de sobrevivência, com a massiva labuta (bruta e física), contrasta com a realidade do trabalho urbano (das tarefas mais leves e intelectualizadas).
Um jovem e uma moça, num destes bailes das colônias, dançaram umas e outras boas marcas. Os dois, num acerto de habilidades, revelaram-se “belos arrasta pés ou excepcionais pés de valsa”. A dança e a música, como diversão e passatempo, ostentava-se uma afeição e paixão (como opção de lazer e prazer). Agrada aqui e acolá; carinho lá e cá foram uma realidade entre a parceria. O fogo da paixão, no sabor da animação e bebedeira, tomaram conta dos aparentes enamorados (“nesta história do fica/finca”).
O moço, nos chega para cá e beijinhos prá lá, atiçou-se nos desejos íntimos. Este, numa altura do embalo (duma marca romântica), desabafa: “- A minha espiga de milho encontra-se bastante atiçada e irrequieta no interior da calça!” A jovem, sentido a malícia das conversas e encostos,  quis safar-se das intensões e pretensões amorosas. O rapaz, numa dessas linguagens de metáfora,  reforçou o escamoteado pedido: “- Esta espiga precisa conhecer algum jeito  de ser debulhada nessa noite!” A moça, em meio a despretensão e franqueza, rebateu: “- Esta debrulhação, no entanto, não será com minha máquina de tirar grãos!”
Poucas e efetivas palavras abreviam uma porção de ladainhas. As figuras de linguagem são uma forma de dizer muito em singelas palavras. Uns relacionamentos, sem o correspondente fogo da paixão, não tem maiores chances de êxito e satisfação. As meninas, nas colônias, são sementes preciosas e raras. Quaisquer moças sentem-se como rainhas num conjunto de pretendentes. As escolhas refinadas encontram-se difíceis em meio as escassas opções.

Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”

Crédito da imagem: http://amicaphilosophiae.blogspot.com.br