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sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Não acredite



"Não acredite em algo simplesmente porque ouviu. Não acredite em algo simplesmente porque todos falam a respeito. Não acredite em algo simplesmente porque está escrito em seus livros religiosos. Não acredite em algo só porque seus professores e mestres dizem que é verdade. Não acredite em tradições só porque foram passadas de geração em geração. Mas depois de muita análise e observação, se você vê que algo concorda com a razão, e que conduz ao bem e beneficio de todos, aceite-o e viva-o".

Buda (563 a.C - 483 a. C.)

Crédito da imagem: http://porquenaocreio.blogspot.com.br/2011/07/descricoes-de-buda-e-jesus-cristo.html

O tesouro dos Mucker


     Uma história oral, narrada de boca em boca entre membros das famílias tradicionais da região, moradores circunvizinhos ao local do Episódio do Ferrabraz (1874), relaciona-se ao tesouro dos Mucker. Aventureiros esporádicos ambicionaram deparar-se com as malfadadas riquezas. Estas teriam sido escondidas ou enterradas pelos seguidores da Jacobina Mentz e João Jorge Maurer. O conjunto de jóias e moedas (de ouro e prata do II Império) encontraria-se nalgum esconderijo das encostas dos morros (circunvizinhas do Ferrabraz). As encostas/elevações, entre os atuais municípios de Dois Irmãos, Campo Bom e Sapiranga/RS, manteriam o resguardo dos materiais... Um amontoado de relíquias ímpares que teriam, em boa dose, sido trazido da Alemanha e outros acumulados durante o Império Brasileiro (1822–1889). Os coloniais, em meio às enormes dificuldades de toda ordem, mantinham uma extrema filosofia de poupadores , porque, a qualquer custo, quiseram resguardar-se dos infortúnios da vida. Os recursos, advindos de suas suadas economias e heranças, teriam sido avolumados/juntados durante a formação e evolução da “seita”. Estes provavelmente ambicionaram adquirir armas, manter espírito de solidariedade (como os cristãos nos Atos dos Apóstolos), custear encargos comunitários, comprar terras (nas novas áreas de colonização)...
     Os boatos, comentários e fofocas das excepcionais riquezas, corriam soltos na boca da população. Inúmeros forasteiros envolveram-se nos eventos bélicos, de abril a agosto de 1874, em função dessas conversas. Os mercenários, vindos das diversas procedências da província, invadiram os lugarejos próximos ao Morro do Ferrabraz, pois queriam colocar as mãos naquela fortuna. Inúmeros indivíduos diziam-se exímios combatentes. Eles lutaram contra uma centena de sectários dos Maurer. As matas, plantações e potreiros viviam infectados de adversários e aventureiros. Estes, juntos aos moradores (inimigos), controlavam os passos dos incompreendidos. As esporádicas escaramuças sucediam-se através confrontos verbais, disparos ocasionais, incêndios de propriedades... As atrocidades, em meio aos desentendimentos, eram permitidas pela segurança pública (pouco interessada em serenar ânimos). Autoridades pareciam atiçar a “guerra entre aparentados e irmãos”. A(s) crueldade/desavenças, reprimida(s) por anos, tinha sobre quem recair, porque simpatizantes ou seguidores dos Maurer eram sempre os autores e culpados. Animais, pomares e plantações viam-se destruídos ou surrupiados (das propriedades) e a conversa era “coisa dos Mucker”.
    O desfecho sangrento, em junho a julho de 1874, teria levado Jacobina e João Jorge Maurer a esconder peças. Estes, às pressas (em meio ao tumulto dos últimos dias), teriam os escondido ou enterrado nalgum lugar das encostas ou sopé dos morros (grutas). Queriam resguardar-se da cobiça e ganância dos adversários. Os poucos quilos de minerais necessitariam duma segurança em função do tamanho esforço e sacrifício em acumular. Uma adequada guarda e proteção seria motivo de prudência e sabedoria. A entrega eventual, a conhecidos ou familiares, poderia gerar conflitos e intrigas. O indivíduo nunca sabe os interesses alheios, que costumam mudar muito rápido conforme as conveniências. A segurança maior poderia unicamente consistir no seio da terra. Este, pela experiência e vivência, costuma por séculos ou milênios proteger relíquias. Os espaços imaginados, como árvores, rochas e valos, poderiam servir de lugar excepcional. O ato, além dos Maurer, certamente recaiu sobre os íntimos da família, que acabaram trucidados.
   A hecatombe, em 2 de agosto de 1874, abateu-se sobre o grupo familiar íntimo. Os assassinatos e suicídios foram uma realidade. As lideranças caíram em desgraça e o segredo foi levado às tumbas. Os autores esqueceram de revelar o paradeiro do tesouro, que tanto contribuiu para acentuar o número de inimigos. Ele provavelmente repousa nos brejos e matos da circunvizinhança ao imponente Ferrabraz, pois jamais sugiram informações sobre achados (ou mantiveram-se na discrição). O espírito dos desventurados, em meio aos remorsos da tragédia, arrogam-se por ventura o direito de resguardá-lo.
     Inúmeros aventureiros e moradores, conhecedores da história dos bastidores do Episódio do Ferrabraz, “ousaram colocar as mãos”. As tentativas falharam e outras continuam a desafiar a cobiça e imaginação, em meio às picadas e trilhas da vegetação. Vários elementos procuram disfarçar as inúmeras procuras, alegando praticar caçadas e trilhas (com vistas de conhecer o cenário geográfico). Alguns dão vazão ao espírito de aventureiros e caçadores, que, por alguma razão, fazem relações com velhos galeões espanhóis. Uma façanha interessante para amantes de caminhadas ecológicas e desbravadores de enigmas. O mistério do tesouro dos Mucker, portanto, parece estar muito mais viva como aparece aos apaixonados e estudiosos do tema. Uma história comunitária contada em diversas conversas informais ou de ouvido em ouvido (entre membros da descendência germânica e com ancestrais envolvidos no conflito). Este, no contexto das novas gerações, parece superado, porém sobrevivem relatos da tragédia (no acontecimento fratricida da história da imigração teuta em terras americanas). Certas conversas sempre ostentam um fundo de verdade (talvez não seja diferente com a história desse tesouro).

Guido Lang, O Fato n° 1006, dia 06/02/1996, pág. 02.

Crédito da imagem: http://nostalgizar.blogspot.com.br/2012/09/bau-de-memorias-imprestaveis.html