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sábado, 6 de julho de 2019

O poluído e sofrido Arroio Schmidt

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Guido Lang

O antigo Arroio de Campo Bom, na época de São Leopoldo, apresentava-se como um bonito e límpido córrego da água, que mesclava romantismo com vida. Algumas partes expressivas do curso fluvial eram cercados por matas e potreiros, quando animais e homens aproveitavam-se das suas águas com vistas de banhar-se a saciar a sede. Os poços, digo partes mais profundas do riacho, eram aproveitadas para as pescarias, quando adultos e gurizada, através da coleta, abafavam “instintos do primitivismo humano”. Os dias, quentes eram sinalizados com turmas de banhistas, que procuravam as águas e sombras com a finalidade de suavizar os rigores do verão campobonense.
O Arroio Schmidt, nos primórdios da colonização, foi cenário de histórias, quando os tropeiros dos Campos de Cima da Serra afluíam ao lugarejo de Campo Bom. Estes, nas suas paradas momentâneas de alguns dias, tratavam de deixar pastar os animais assim como saciar sua sede. As margens abrigavam ricas pastagens naturais, que eram intensivamente aproveitadas com razão do gado repôr as energias. Os condutores das manadas, com destino aos matadouros de São Leopoldo e Porto Alegre, acabavam nas suas cercanias, quando, em função dos bons pastos, alguém lembrou-se de denominar a área de campos bons. O nome, na passagem dos anos, acabou senão a denominação oficial do lugar.
A triste sina do riacho começou propriamente com a colonização, quando, ao longo dos anos, progressivamente ceifou-se a mata. A floresta original sucessivamente viu-se tolhida em função da necessidade de áreas agrícolas, no qual poder-se-ia efetuar cultivos e processar-se criações. O assoreamento do curso, com o constante acúmulo de sedimentos, foi uma contínua, quando progressivamente influiu-se na mudança e perecimento do habitat. Diversas espécies de animais e vegetais perderam o seu ambiente natural, quando instalou-se o melancólico cenário.
O advento da urbanização, com a instalação da rede de esgotos nas principais avenidas e ruas – a partir de 1970, veio a reforçar o estado de poluição, quando não se restringia exclusivamente aos problemas ligados a curtição de couros. A limpeza doméstica passou a desaguar no seu curso, quando acentuou-se o extermínio da vida. O lixo orgânico, advindo dos esgotos ou das enchentes, alteraram o processo de renovação das águas, quando mostrou-se excessivo ao volume da razão do curso líquido. Os lixos inorgânicos, sobretudo plásticos, acabaram nalguma forma no leito, quando reforçaram a aparência e contexto de “lixeira a céu aberto”.
A canalização parcial, juntamente com o Arroio Deuner (atual Arroio Leão) – na administração do prefeito Osmar Alfredo Ermel (1969/1973), veio reforçar sua nova função social, que seja de “dar um jeito nas imundícies humanas”. Esta solução seria de levar para longe a sujeira, no qual, a natureza, no Rio dos Sinos e na Lagoa do Guaíba, pudesse processar uma reciclagem dos materiais imundos. Procurou-se, como é comum no gênero humano, “varrer a sujeira debaixo do tapete”, porque, num contexto de acentuado progresso econômico, havia necessidades sociais mais proeminentes na comuna. A voga do melhoramento da infraestrutura básica era a tônica predominante, quando um pacato arroio poderia ser tranquilamente sacrificado.
A União Protetora do Ambiente Natural de Campo Bom (UPAN), em 1988, fez zum estudo do leito do Arroio Schmidt, quando apontou e constatou a exagerada poluição no córrego. As principais dificuldades relacionaram-se: “ao lixo cloacal e de produtos usados na limpeza doméstica lançada no arroio através dos esgotos”; “grande parte de lixo orgânico lançado pela comunidade” dentro do riacho; lixo depositado as suas margens; os afluente do Schmidt, como o Paulista e Quatro Colônias, também vem poluídos e acentuam a calamidade; à beira do arroio mantinha uma plataforma de lançamento de lixo e empresas lançavam resíduos químicos. Apresentou-se como paliativos, para melhorar a qualidade das águas, lançar plantas aquáticas (marrequinhas) assim como edificar pequenas barragens para originar quedas.
As administrações do Nestor Fips Schneider (1977-1982) e Elio Erivaldo Martin (1982-1983), com vistas de oferecer uma área de recreação aos moradores e talvez recompensar o curso fluvial pelas mazelas originadas pelo desenvolvimento econômico, instalaram o Parque Municipal da Integração (vulgar “Parcão”), quando produziu-se uma das maiores incoerências da urbanização. Uma ampla e bela paisagem artificial, cartão de visita da comuna, e símbolo de investimentos públicos na qualidade de vida da população, é banhada e cortada pelo fedorento, poluído e sujo curso fluvial, que choca e interroga quaisquer visitantes. Umas clássicas perguntas comumente surgem: Como um cenário tão agradável e magnífico pode ser cortado por uma sarjeta? Porque as administrações nunca tomaram providências? Quem causa tamanha agressão ambiental?
O outrora Arroio Campo Bom, a semelhança da trajetória do passado, continua sinalando história. Este, em função da localização, parece vingar-se das permanentes violações, quando retrata a triste sina dos cursos fluviais nos centros urbanos. A função de condutor de águas cedeu espaço à tarefa de escoadouro de imundícies. Segue tua saga! O Projeto Pró-Guaíba talvez seja uma oportunidade de relembrarem-se da tua almejada e sonhada despoluição.

Autor: Guido Lang
Fonte: Jornal O Fato, número 1133, dia 29/04/1997, página 02.


Crédito da imagem: https://agazetacb.com.br/noticias/e-se-o-arroio-schmidt-fosse-revitalizado