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quarta-feira, 13 de março de 2013

Uma curiosa dúvida


Um pacato colono, como marca registrada, mantinha a acirrada curiosidade. Ele, como agricultor, adorava alguma conversação e novidade. Este, para tal finalidade, possuía um infindável tempo. O trabalho, na agricultura familiar de subsistência, poderia esperar (na proporção de haver oportunidades de boas e interessantes conversas e diálogos).
Os acontecimentos comunitários, como momentos de convivência, não deixavam de passar em branco. Estes, para não desperdiçar os rumos dos acontecimentos, ganhavam uma atenção e dedicação especial. A despreocupação, em termos gerais (com a propriedade), levaram-no a ser um modesto morador. Uma vida familiar singela e sem maiores luxos. O acúmulo de sobras foi inexpressivo (nas várias décadas de existência).
Um determinado encontro de cooperativados, na entidade comunitária local, ocorreu num certo dia. A conversa informal, antes e após a reunião, sucedeu-se entre os vários participantes. Os assuntos versados, de maneira geral, eram os mais diversificados. As criações e plantações, como produtores rurais, ganhavam a tônica das atenções e preferências. Os colonos-associados, aqui e acolá, relataram suas experiências e vivências.
O curioso, num determinado instante, conversou com o presidente da cooperativa. Este, como chefe maior e líder regional, era “aquele que fazia acontecer/chover”. O rural, como de práxis, queria satisfazer mais uma dessas suas ímpares curiosidades. Este, como velho amigo e conhecido, perguntou: “- Fulano de tal! Como se explica o fato? O teu irmão trabalha como produtor rural. Este, apesar da dedicação e trabalho, convive com as constantes dificuldades financeiras. O dinheiro auferido mal dá para viver! Ele, nesses anos todos, judiou-se e não acumulou nada de expressivo. A realidade econômica, como irmão/mano, contrasta com o senhor. As pessoas falam que você é um homem muito influente e rico!”
O camarada presidente, na sua maneira de ser curto e preciso (na tradicional franqueza), deu uma leve gargalhada e suspirou fundo. Este, sem floreios e rodeios, explicou: “- Esta situação é fácil de compreender e entender! O meu irmão, como homem da terra, costuma labutar com uma junta de animais. Eu, como administrador e contador, trabalho com mais de dois mil bois! A acentuada diferença nos números resulta no acúmulo do numerário financeiro!”
O ouvinte ficou assombrado e estarrecido. Ele, como os muitos moradores associados, faziam parte dessa boiada/manada. A acentuada diferença, no acúmulo de sobras entre as partes, era a comprovação dos fatos. A sabedoria consiste: quem trabalha, de forma animal e braçal, não tem maior tempo de pensar em ganhar dinheiro. O segredo monetário não está na produção dos artigos e sim na intermediação das mercadorias. As diferenças econômicas, entre governados e governantes, cedo salta aos olhos (como diferenças de classe/entre ter e não ter).
O excesso de curiosidade expõem os autores ao ridículo. As perguntas direcionadas aos espertos ainda não custam; as verdades (relativas) porém nem sempre são relatadas. Poucos são aqueles que conseguem conviver com as dúvidas. Umas boas respostas assumem valores de umas valiosas pérolas.

Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”

Crédito da imagem: http://agroinformacao.blogspot.com.br