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terça-feira, 20 de novembro de 2012

As estranhas casas (Muckers)


     
Morro do Ferrabraz/Sapiranga/RS, local aonde se passou o Episódio dos Muckers.

    Umas construções anômalas haviam/existem nas localidades da Boa Vista e Catarina/Colônia Teutônia (atual Teutônia/RS). Estas, nas primeiras décadas sucessivas a colonização (1858-1928), foram edificadas no interior das picadas (hoje localidades). Alguns moradores, de imediato, denominaram-nas de forma imprópria no contexto das conversas informais.
O sui generis, ao tradicional, relaciona-se ao acesso no interior das construções! Os construtores/moradores abstiveram-se de edificar as portas frontais. Estas haviam no sentido lateral (norte/sul e não ao rotineiro leste/oeste – direção das propriedades). Alguma janela, para fácil visão das entradas e saídas (do lote), substituía a porta frontal. A localização da entrada tomava o sentido lateral (com relação ao acesso da entrada geral/principal). As moradias, neste modelo (vistos duma distância maior/"rua"), pareciam carecer de porta principal.
Alguma prática construtivista própria das velhas colônias (trazida da Europa e certamente adaptada às necessidades da América). As famílias, com este modelo construtivista, viam-se originárias, de maneira geral, da Colônia Alemã de São Leopoldo (filhos e netos das primeiras levas de imigrantes e oriundos das necessidades de novas terras em função da alta natalidade dos pioneiros). Professavam o luteranismo evangélico (protestante). Descendiam de imigrantes provenientes da região do Hunsrück/Reno/Alemanha. Tinham sofrido desavenças e problemas com a Episódio dos Mucker (1874) no Morro Ferrabraz (atual Sapiranga/RS).
O curioso, no seio das relações sociais, ligava-se ao quadro de brigas e intrigas criados no contexto das convivências. Diversos moradores, por alguma razão, mantinham-se desconfiados e intrigados como vizinhança. As causas, entre outras, poderiam advir de laços consanguíneos, divergências com inventários (divisão de espólios), desentendimentos com divisas (nas propriedades/lotes), desavenças em diretorias/gestões das entidades comunitárias (escola, igreja, sociedade)...
O quadro, até os anos de 1970, mantinha-se acirrado e criara facções no seio colonial. Vizinhos abdicaram do tradicional cumprimento mútuo. Outros deixaram de falar-se e visitar-se. Histórias de desentendimentos e relações escusas eram fatos corriqueiros. Algumas desavenças estendiam-se por gerações (entre as clãs). Predominava um clima de desunião generalizada! Sinônimo de atraso comunitário nas entidades (futebol amador, ordem das senhoras evangélicas, sociedade de cantores...). A mudança de gerações, com o perecimento das velhas estirpes, reverteu o quadro de confrontos e os jovens viveram sob o prisma dos ventos da inovação cultural-tecnológica.
 O curioso: conhecia-se a descendência a partir do estilo das casas. O morador, de acordo o modelo, revelava o íntimo da descendência/procedência de austríacos, hunsrücker ou westfalianos (correntes da procedência dos pioneiros destas paragens). O bom entendedor, perpassando a estrada geral e apreciando a moradia, sabiam quem era quem nesta história das origens. Ofender alguém, de forma profunda, consistia em denominar-lhe sob a alcunha de Mucker ("zum-zum" das abelhas).
Algumas residências, neste estilo, subsistem a ação das reformulações (modernidade) e continuam cumprindo sua nobre função social (de abrigar três, quatro a cinco gerações de descendentes no idêntico teto edificados pelos ancestrais). A localidade, a exemplo da atual Boa Vista Fundos/Teutônia/RS, recebeu durante um bom tempo a alcunha de Canto/Recanto dos Mucker (pejorativo advindo dentre os próprios moradores e reconhecidos entre moradores de localidades circunvizinhas).
Singelos detalhes revelam crenças e preferências! Brigas e intrigadas, em função do excessivo conhecimento e intimidade, são rotina entre moradores de pacatas comunidades. Resquícios de desavenças e falatórios sobrevivem às gerações. Cada comunidade com suas histórias, problemas e vivências!

Guido Lang
Livro “Histórias das Colônias”
(Literatura Colonial Teuto-brasileira)

Crédito da imagem: http://www.turismo.rs.gov.br/portal/index.php?q=galeria&g=6

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