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quarta-feira, 1 de abril de 2020

O SUICIDA MASOQUISTA


Guido Lang

A vida depara-nos com inúmeras personalidades, nas quais incluem- se aquelas que sentem prazer com o sofrimento. Estes parecem adorar a auto-flagelação, assim como ocasionar incômodos alheios. As colônias também possuem este tipo de indivíduos que, momentaneamente, extrapolam a convivência comunitária.
Um colono resolveu tomar-se a vida, e fez referência aos propósitos. Amigos, familiares e vizinhos nem mais davam importância às “colocações furadas”. Alguns chegavam a interrogar sobre as razões daquele propósito, que estaria ligado a monotonia da existência. As dificuldades econômicas, carência de afeto familiar, trabalho excessivo eram causas, assim como doenças em função da chuva, ao frio, ao sol e ao vento na labuta rural.
A saúde, na juventude, parecia-lhe eterna, mas agora encontrava-se na velhice, sentindo os reflexos da imprudência. O rural, num belo dia, resolveu botar em prática seu palavreado. Pensou e refletiu muito em qual a maneira mais eficaz de ceifar-se a existência. Lembrou-se do poço fundo, que se localizava próximo à propriedade e do curso fluvial regional. O local, no verão, era aproveitado como balneário, onde alguns descuidosos pagaram a ousadia com a vida (em função de avançar excessivamente naquele poço).
O suicida, com o objetivo de confundir aqueles que viriam procurar o seu corpo, deixou seus chinelos nas pedras circunvizinhas ao poço fundo. Os colonos, depois do sumiço do morador, passaram a procurar o cidadão ou seu cadáver pela localidade, quando depararam-se com os artefatos de couro numa margem do rio. O suicídio naquelas águas parecia óbvio, que foram cuidadosamente vasculhadas. Homens-rã foram requisitados, mas nada de localizar o cadáver.
O curso fluvial, por quilômetros, foi percorrido em vão. Os abutres, dias depois, sobrevoaram a área e sinalizaram determinada putrefação. O cidadão tinha-se tomado a vida bem longe das pistas sinalizadas. Este valeu-se duma artimanha com a finalidade de confundir seus conhecidos.
O ser humano é capaz de empregar estratagemas esdrúxulos, quando almeja apagar pistas e confundir provas.

* Texto extraído de "CONTOS DO COTIDIANO COLONIAL" (2000), página 48, de GUIDO LANG.

* Edição: Júlio César Lang

* Crédito da imagem: https://www.tripadvisor.com.br/LocationPhotoDirectLink-g1927726-d7777798-i295971917-Tunel_da_Mantiqueira-Passa_Quatro_State_of_Minas_Gerais.html

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