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terça-feira, 15 de janeiro de 2013

O brejo

Um pacato colonial, trabalhador braçal da agricultura familiar de subsistência, foi cultivar sua tradicional lavoura de aipim. Ela, em função da pequena propriedade, localizou-se nos fundos do lote. O local mantinha-se próximo a uma estrada de chão. O acesso, pela vila, situa-se a meia dúzia de quilômetros.
O morador, criado nas colônias e filho de agricultores, deu vazão aos conhecimentos e práticas agrícolas. Qualquer colono, no mínimo como produtor, precisa colher os artigos básicos à subsistência. Significa algum aipim, batata, frutas, hortaliças, milho, verduras... Produzir igualmente alguma carne, leite e ovos. Uma maneira de diminuir custos/dispêndios no mercado. Estes plantios exigem um cuidado especial. A título de exemplo: adubação, capina, erosão, sementes... Os inços, voltas e meia, precisam ser combatidos. Alguma capina manual faz-se necessária (caso contrário nem “adianta arriscar a sorte”). Algumas espécies sensíveis não adiante querer insistir com herbicidas.
O rural, como complemento ao consumo, plantou algum aipim a mais (para venda). Poderia, no mercado dum conhecido, trocar por produtos de consumo. Investiu dinheiro e tempo na cultura, que cedo correspondeu à dedicação e trabalho. Passou-se uns meses e as raízes tomaram forma. Um cardápio com aipim novo, com acrescido de abóbora e feijão novo (somado a guisado ou ovo frito), “dava água na boca”.
A surpresa adveio com a precoce colheita. Várias dezenas de pés, alheio ao pedido do dono, viram-se arrancados e colhidos. O proprietário, aos familiares e vizinhos, falou do inconveniente ocorrido. O pessoal, num pré-combinado, passou a reparar a presença de alheios (nas redondezas da plantação). A notícia, num entardecer de domingo, achegou-se aos ouvidos do plantador. Havia a circulação de algum estranho. Alguém, com mochila nas costas, havia sido visto entrando lavoura adentro.
O cidadão, como da práxis colonial, saiu com ferramenta nas costas. Um desconhecido encontrava-se sentado no interior da roça. Pediu a razão da incômoda presença do elemento naquele espaço. A surpresa, de cair o queixo, adveio: havia mais outros dois. Um, de imediato, mostrou a arma na cintura. O plantador, por pouco, não apanhou ou levou corridão na sua própria lavoura e terra.
O colono, noutro dia, foi dar queixas na delegacia. As autoridades pediram em trazer três testemunhas e pagar alguma taxa. Admirou-se daquelas exigências e transtornos. Resolveu deixar por isso mesmo. Ele, pensando alto, ainda disse: “- Alguns, numa hora dessas, acabarão parando no hospital!”. Algum policial, ouvindo a fala, interrogou: “- Como assim? Encontras a fazer ameaça de alguma desgraça maior?” O pacato colonial retrucou: “- Vou plantar da mandioca brava/paraguaia como remédio aos larápios!” Estes, na vila, eram velhos conhecidos e colegas de trabalho de amigos. O produtor, no ano vindouro, deixou o brejo tomar conta do espaço. Outro produtor desestimulado em função impunidade e ousadia alheia.
A roubalheira, com o “tal em flagrante”, torna-se fator de inibição produtiva. O país, neste ritmo, ostentará lá adianta carência de empreendedores e inovadores. Quem se empenha e trabalha acaba penalizado com a extorsão (alheia e fiscal). Leis brandas, com a sensação de impunidade, favorece a bandidagem.                                                                                                                    
Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”

Crédito da imagem:http://www.iapar.br/modules/noticias/article.php?storyid=1355 

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