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domingo, 17 de março de 2013

O cheiro


Os pastores, de determinada confessionalidade religiosa, advinham da Europa. Outros, filhos da terra, eram enviados ao Velho Continente para o estudo universitário. A colonização, com suas muitas carências de toda ordem, não tinha como estabelecer entidades de formação teológica. Esta, nas décadas sucessivas, conheceu sua fundação (como estabelecimento à formação pastoral).
A tradição oral, em mais umas das suas muitas e variadas histórias, conta o relato de determinado religioso. Este, saindo jovem das colônias e passando anos nas cidades europeias, acabou destacado à determinada comunidade do  interior. Este, num lugarejo (distante de maiores centros urbanos), tornou-se uma espécie de autoridade. Ele, na compreensão de muitos fiéis, era o elo/ente estabelecido entre o divino e o profano. Os pastores, pela consideração em relação aos moradores e pela sua especial formação, ganhavam a maior admiração, consideração e respeito. As palavras do religioso, em geral, ostentavam-se uma espécie de velada lei.
O fulano, como jovem esbelto e solteiro, foi recepcionado em determinada família. Um hóspede muito especial e ímpar. A moça do clã, sabendo das condições de desimpedido,  mantinha-o como um bom par. Os familiares, de alguma forma, facilitaram no relacionamento e eventuais intimidades. O religioso, pela formação e seriedade, não oferecia maiores perigos à jovem da família.
Ela, num domingo a tarde, foi destacada para mostrar o patrimônio familiar e uma visão panorâmica da localidade. O casal/as partes, de forma descompromissada, saíram a cavalgar pela estrada geral. Os potreiros, de modo geral, estendiam-se nas beiradas e percursos da via. Imensos gramados, com amplas criações (aves, bovinos, ovinos e suínos), reafirmaram  o progresso colonial.
Estes, num determinado ponto, depararam-se com alguma vaca em cio e o touro predisposto a fazer sua função (máscula). O jovem, como curioso nato, perguntou: “- Como o touro sabe dos desejos da vaca?”  A menina moça, criada entre criações e plantações, rebateu: “- Este sabe pelo cheiro e o líquido escorrendo na parte vaginal!”
Estes, numa certa altura, foram andando nos seus pingos. A jovem moça, num trajeto das andanças, não aguentou o descaso e indiferença da parceria. Esta, de forma curta e seca, interrogou: “- Não cheiras nada de diverso?” O religioso, na sua astúcia e temor (de comentários e comprometimentos futuros), replicou: “- Não! Quê poderia cheirar de diverso?” Aí a moça, numa explanação ímpar, externou seu espanto e desejo: “- Mostras-te mais burro e inexperiente como o touro?” 
Certas ofertas, numa determinada época e contexto social, eram compromissos e obrigações na certa. A carne dos desejos, em todas as épocas e situações, ostenta-se fraca e predisposta a tentação.
As afinidades humanas afinam-se e unem-se no contexto da convivência. O cidadão, para amar e gostar, precisa ter afinidade e desejos amorosos com o próximo (caso contrário convém abster-se de certas iniciativas e práticas). Alguém, no contexto das intimidades e relacionamentos, precisa tomar a iniciativa da ação.

Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”

Crédito da imagem: http://www.algarvehousing.net

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