Uma
história oral, narrada de boca em boca entre membros das famílias
tradicionais da região, moradores circunvizinhos ao local do Episódio
do Ferrabraz (1874), relaciona-se ao tesouro dos Mucker. Aventureiros
esporádicos ambicionaram deparar-se com as malfadadas riquezas.
Estas teriam sido escondidas ou enterradas pelos seguidores da
Jacobina Mentz e João Jorge Maurer. O conjunto de jóias e moedas (de
ouro e prata do II Império) encontraria-se nalgum esconderijo das
encostas dos morros (circunvizinhas do Ferrabraz). As
encostas/elevações, entre os atuais municípios de Dois Irmãos,
Campo Bom e Sapiranga/RS, manteriam o resguardo dos materiais... Um
amontoado de relíquias ímpares que teriam, em boa dose, sido
trazido da Alemanha e outros acumulados durante o Império Brasileiro
(1822–1889). Os coloniais, em meio às enormes dificuldades de
toda ordem, mantinham uma extrema filosofia de poupadores , porque, a
qualquer custo, quiseram resguardar-se dos infortúnios da vida. Os
recursos, advindos de suas suadas economias e heranças, teriam sido
avolumados/juntados durante a formação e evolução da “seita”.
Estes provavelmente ambicionaram adquirir armas, manter espírito
de solidariedade (como os cristãos nos Atos dos Apóstolos), custear
encargos comunitários, comprar terras (nas novas áreas de
colonização)...
Os
boatos, comentários e fofocas das excepcionais riquezas, corriam
soltos na boca da população. Inúmeros forasteiros envolveram-se
nos eventos bélicos, de abril a agosto de 1874, em função dessas
conversas. Os mercenários, vindos das diversas procedências da
província, invadiram os lugarejos próximos ao Morro do Ferrabraz,
pois queriam colocar as mãos naquela fortuna. Inúmeros indivíduos
diziam-se exímios combatentes. Eles lutaram contra uma centena de
sectários dos Maurer. As matas, plantações e potreiros viviam
infectados de adversários e aventureiros. Estes, juntos aos
moradores (inimigos), controlavam os passos dos incompreendidos. As
esporádicas escaramuças sucediam-se através confrontos verbais,
disparos ocasionais, incêndios de propriedades... As atrocidades, em
meio aos desentendimentos, eram permitidas pela segurança pública
(pouco interessada em serenar ânimos). Autoridades pareciam atiçar
a “guerra entre aparentados e irmãos”. A(s) crueldade/desavenças,
reprimida(s) por anos, tinha sobre quem recair, porque simpatizantes ou
seguidores dos Maurer eram sempre os autores e culpados. Animais,
pomares e plantações viam-se destruídos ou surrupiados (das
propriedades) e a conversa era “coisa dos Mucker”.
O
desfecho sangrento, em junho a julho de 1874, teria levado Jacobina e
João Jorge Maurer a esconder peças. Estes, às pressas (em meio
ao tumulto dos últimos dias), teriam os escondido ou enterrado
nalgum lugar das encostas ou sopé dos morros (grutas). Queriam
resguardar-se da cobiça e ganância dos adversários. Os poucos
quilos de minerais necessitariam duma segurança em função do
tamanho esforço e sacrifício em acumular. Uma adequada guarda e
proteção seria motivo de prudência e sabedoria. A entrega
eventual, a conhecidos ou familiares, poderia gerar conflitos e
intrigas. O indivíduo nunca sabe os interesses alheios, que costumam
mudar muito rápido conforme as conveniências. A segurança maior
poderia unicamente consistir no seio da terra. Este, pela experiência
e vivência, costuma por séculos ou milênios proteger relíquias.
Os espaços imaginados, como árvores, rochas e valos, poderiam
servir de lugar excepcional. O ato, além dos Maurer, certamente
recaiu sobre os íntimos da família, que acabaram trucidados.
A
hecatombe, em 2 de agosto de 1874, abateu-se sobre o grupo familiar
íntimo. Os assassinatos e suicídios foram uma realidade. As
lideranças caíram em desgraça e o segredo foi levado às tumbas.
Os autores esqueceram de revelar o paradeiro do tesouro, que tanto
contribuiu para acentuar o número de inimigos. Ele provavelmente
repousa nos brejos e matos da circunvizinhança ao imponente
Ferrabraz, pois jamais sugiram informações sobre achados (ou
mantiveram-se na discrição). O espírito dos desventurados, em
meio aos remorsos da tragédia, arrogam-se por ventura o direito de
resguardá-lo.
Inúmeros
aventureiros e moradores, conhecedores da história dos bastidores do
Episódio do Ferrabraz, “ousaram colocar as mãos”. As tentativas
falharam e outras continuam a desafiar a cobiça e imaginação, em
meio às picadas e trilhas da vegetação. Vários elementos procuram
disfarçar as inúmeras procuras, alegando praticar caçadas e
trilhas (com vistas de conhecer o cenário geográfico). Alguns dão
vazão ao espírito de aventureiros e caçadores, que, por alguma
razão, fazem relações com velhos galeões espanhóis. Uma façanha
interessante para amantes de caminhadas ecológicas e desbravadores
de enigmas. O mistério do tesouro dos Mucker, portanto, parece
estar muito mais viva como aparece aos apaixonados e estudiosos do
tema. Uma história comunitária contada em diversas conversas
informais ou de ouvido em ouvido (entre membros da descendência
germânica e com ancestrais envolvidos no conflito). Este, no
contexto das novas gerações, parece superado, porém sobrevivem
relatos da tragédia (no acontecimento fratricida da história da
imigração teuta em terras americanas). Certas conversas sempre
ostentam um fundo de verdade (talvez não seja diferente com a
história desse tesouro).
Guido
Lang, O Fato n° 1006, dia 06/02/1996, pág. 02.
Crédito da imagem: http://nostalgizar.blogspot.com.br/2012/09/bau-de-memorias-imprestaveis.html