Um camarada, muito
ambicioso e individualista, achava que levaria algum patrimônio dessa vida.
Este possuía um excepcional apego e paixão pelo dinheiro. Os volumes, por sua
ganância e obsessão nunca pareciam-lhe o suficiente. Quaisquer
trocados cedo revertiam nalguma compra de terras ou depósitos em cadernetas.
Uma dupla de adoidados e logrados combinaram uma peripécia. Esta, em forma de
afronta e lição, vira-se aplicado como sabedoria.
Os dois elementos,
conhecidos deste como vizinhos, alimentavam nojo e raiva. Um negócio, mal
acertado, tinha-lhes causado prejuízos monetários. Esta perda, por semanas e
meses, incucava-lhes as ideias e pensamentos. A astúcia e esperteza consistia
em criar e perpetuar. Os camaradas, em determinado horário e dia, sabiam do
cidadão dirigir-se na direção do núcleo colonial. Aquela costumeira tarde da
quarta-feira era o momento propício. O espaço próprio ao baralho/cadeado na
sociedade comunitária. O local da reunião dos moradores da comuna. O ambiente
ideal dos comentários e fofocalhadas sucedidas na localidade. O ancião, na
tradicional montaria, monta no saino e toma a direção da estrada
geral.
O chão batido da
estrada, entre contornos e curvas (como cobra estendida numa visão
panorâmica das elevações maiores na direção dos vales), estendia se
no cenário rural. O trajeto, das encostas na direção das baixadas, via-se
íngreme e de difícil deslocamento. As lavouras de aipim, cana, forragens,
milho estendiam-se pelas margens. As propriedades, minifundiários
de subsistência familiar, valiam-se da massiva exploração econômica. Estas, com
o aumento populacional, pareciam não dar conta das necessidades de subsistência
de inúmeras famílias.
Os espertalhões, no
papel de malandros, confeccionam uma polpuda carteira (forrada de papel com
alguma nota de menor expressão caída para fora). Esta, numa primeira visão,
mostrara-se abonada e recheada de dinheiro. Ela, entre uma lavoura de cana e
mandioca, vira-se colocada, como extraviada, em meio ao caminho da estrada
geral. Esta, como ardil, escondia um discreto fio de nylon (amarrado), com
razão de arrastá-la/puxá-la, na proporção do interesse. O senhor, no percurso,
aconchega-se e vê estirado o artefato. Procura, num ato repentino,
certificar-se de ser uma carteira.
O cavalheiro, apesar
da avançada idade e dificuldade de locomoção, desce de supetão do
exuberante animal. Este, de imediato, tenta ajuntar a peça. Esta,
arrastada/puxada, “parece sair caminhando diante do cidadão”. A dupla
escondida, no interior da vegetação, diverti-se com o assombro e reclamo
alheio. Estes, na surdina, relegaram o artefato numa altura e saem na
disparada (agachados lavoura afora).
O ancião, com a
chacota, sentiu-se muito agredido e irritado. Este desconheceu os elementos,
porém suspeitou do fulano e sicrano. O xingado, em bom dom, tomou vulto. As
gargalhadas, diante do esdrúxulo comportamento (em meio as plantações),
tornaram-se exaustivas. O impróprio, como lorota, difundiu-se cedo pela comuna.
A correção e seriedade, dentro do espírito estoico, reforçaram a
irritações, raivas e xingamentos.
A dificuldade maior,
por falta de barranco/elevação melhor, consistiu em querer voltar a montar o
exuberante animal. O vigor físico, com avançada idade, ainda pouco colaborou
para pisar no estribo e erguer-se em cima da montaria. O jeito foi caminhar e
conduzir o animal. O camarada, naquele dia, absteve-se de jogar seu bife e
canastra. A solução foi deixar seus parceiros na mão e passar como tratante
junto aos companheiros (diante do combinado). A afronta e chacota
alteraram os ânimos e disposições (“estragaram-lhe a tarde”). O sucedido
poderia ser perdoado, porém jamais esquecido.
Um passatempo
predileto de uns, no seio colonial, consistia em importunar os deveras corretos
e pontuais. O ser humano, com alguma inconveniência, adora tirar chacota e
passar lorotas aos próximos (com razão de conhecer as atitudes e
procedimentos). A monotonia rural, com o excesso de tranquilidade e
falta de acontecimentos, via-se rompido com alguma afronta e peça anômala.
Guido Lang
“Singelas Histórias
do Cotidiano das Colônias”
Crédito
da imagem: http://luziafelizidade.blogspot.com.br