Morro do Ferrabraz/Sapiranga/RS, local aonde se passou o Episódio dos Muckers.
Umas construções
anômalas haviam/existem nas localidades da Boa Vista e Catarina/Colônia
Teutônia (atual Teutônia/RS). Estas, nas primeiras décadas sucessivas a
colonização (1858-1928), foram edificadas no interior das picadas (hoje
localidades). Alguns moradores, de imediato, denominaram-nas de forma imprópria
no contexto das conversas informais.
O sui generis, ao
tradicional, relaciona-se ao acesso no interior das construções! Os
construtores/moradores abstiveram-se de edificar as portas frontais. Estas
haviam no sentido lateral (norte/sul e não ao rotineiro leste/oeste – direção
das propriedades). Alguma janela, para fácil visão das entradas e saídas (do
lote), substituía a porta frontal. A localização da entrada tomava o sentido
lateral (com relação ao acesso da entrada geral/principal). As moradias, neste
modelo (vistos duma distância maior/"rua"), pareciam carecer de porta
principal.
Alguma prática
construtivista própria das velhas colônias (trazida da Europa e certamente
adaptada às necessidades da América). As famílias, com este modelo
construtivista, viam-se originárias, de maneira geral, da Colônia Alemã de São
Leopoldo (filhos e netos das primeiras levas de imigrantes e oriundos das
necessidades de novas terras em função da alta natalidade dos pioneiros).
Professavam o luteranismo evangélico (protestante). Descendiam de imigrantes
provenientes da região do Hunsrück/Reno/Alemanha. Tinham sofrido desavenças e
problemas com a Episódio dos Mucker (1874) no Morro Ferrabraz (atual
Sapiranga/RS).
O curioso, no seio
das relações sociais, ligava-se ao quadro de brigas e intrigas criados no
contexto das convivências. Diversos moradores, por alguma razão, mantinham-se
desconfiados e intrigados como vizinhança. As causas, entre outras, poderiam
advir de laços consanguíneos, divergências com inventários (divisão de
espólios), desentendimentos com divisas (nas propriedades/lotes), desavenças em
diretorias/gestões das entidades comunitárias (escola, igreja, sociedade)...
O quadro, até os anos
de 1970, mantinha-se acirrado e criara facções no seio colonial. Vizinhos
abdicaram do tradicional cumprimento mútuo. Outros deixaram de falar-se e
visitar-se. Histórias de desentendimentos e relações escusas eram fatos
corriqueiros. Algumas desavenças estendiam-se por gerações (entre as clãs).
Predominava um clima de desunião generalizada! Sinônimo de atraso comunitário
nas entidades (futebol amador, ordem das senhoras evangélicas, sociedade de
cantores...). A mudança de gerações, com o perecimento das velhas estirpes,
reverteu o quadro de confrontos e os jovens viveram sob o prisma dos ventos da
inovação cultural-tecnológica.
O curioso: conhecia-se a descendência a partir
do estilo das casas. O morador, de acordo o modelo, revelava o íntimo da
descendência/procedência de austríacos, hunsrücker ou westfalianos (correntes
da procedência dos pioneiros destas paragens). O bom entendedor, perpassando a
estrada geral e apreciando a moradia, sabiam quem era quem nesta história das
origens. Ofender alguém, de forma profunda, consistia em denominar-lhe sob a
alcunha de Mucker ("zum-zum" das abelhas).
Algumas residências,
neste estilo, subsistem a ação das reformulações (modernidade) e continuam
cumprindo sua nobre função social (de abrigar três, quatro a cinco gerações de
descendentes no idêntico teto edificados pelos ancestrais). A localidade, a
exemplo da atual Boa Vista Fundos/Teutônia/RS, recebeu durante um bom tempo a
alcunha de Canto/Recanto dos Mucker (pejorativo advindo dentre os próprios
moradores e reconhecidos entre moradores de localidades circunvizinhas).
Singelos detalhes
revelam crenças e preferências! Brigas e intrigadas, em função do excessivo
conhecimento e intimidade, são rotina entre moradores de pacatas comunidades.
Resquícios de desavenças e falatórios sobrevivem às gerações. Cada comunidade
com suas histórias, problemas e vivências!
Guido Lang
Livro “Histórias das Colônias”
(Literatura Colonial Teuto-brasileira)
Crédito da imagem: http://www.turismo.rs.gov.br/portal/index.php?q=galeria&g=6