Alocução à bandeira
Discurso pronunciado em 19 de novembro
"Estamos aqui presentes,
Governo, Forças Armadas, e uma vasta assembléia de povo, para saudar-te, pendão
da Pátria!
Evocamos, na tua
contemplação, a nossa História, seqüência soberba de sacrifícios e de sonhos,
de decepções e de fé rediviva, de lances heroicos e de trabalho profícuo.
A imensa Nação que a
língua, a cruz, o amor fraternal, e a vigilância e o gênio dos estadistas,
conservaram inteira, para o nosso próprio exemplo, para o nosso próprio bem, e
para o mundo melhor, que desejamos.
As três raças que a
constituem, e tu representas, se casaram na tranqüilidade do abrigo do seu
pálio. Significas tudo. A primeira missa na terra apavorante e agreste. As
entradas, no sertão inviolado e misterioso. A repulsa cruenta do estrangeiro da
expedição invasora. O mártir que foi ao patíbulo na serenidade dos que crêem, e
na certeza dos que sabem.
A declaração do
Ipiranga, e o Império do concidadão magnânimo e singelo,
que morreu em país longínquo,com a cabeça reclinada
no solo natal, e a segurança da justiça da posteridade.
És a espada de Osório,
o democrata, e a de Caxias, a cólera bíblica da união indissolúvel, e a de
Tamandaré, o momento augusto da
nossa expressão oceânica.
És a ‘Lei Áurea’ da
Princesa que renunciou a um trono, e satisfez o coração e os
impulsos da solidariedade.
És a República que a
vocação coletiva procurava. A República de Benjamin Constant, de Deodoro e de
Floriano – as armas do novo regime.
A República de
Prudente, de Campos Sales e de Rodrigues Alves, o escrúpulo na Constituição, a
mística unção pelo patriotismo de
todos.
És Rui a proclamar a
força do direito, e a soberania das ruas e dos campos.
És o holocausto na
Itália, e cada um daqueles marcos brancos, que nos inquietam o sono, nas
terríveis advertências que fazem.
És o Congresso, da
autoridade que emana do sufrágio livre; a Toga impoluta que aplica os decretos;
os bordados do oficial que te protege, as mãos calosas do operário que te
engrandece; o livro e o riso da criança; a vibração e a pureza do
universitário.
Aqui nos reunimos para
te dizer que acreditamos em ti, e na tua destinação de símbolo da
nacionalidade.
Aqui,e na festa das
tuas cores, renovamos à tua presença, os solenes compromissos comuns.
De absoluta limpidez na
honra. De absoluta exação no dever.
De absoluta
imparcialidade no Juízo. De absoluto rigor no julgado.
De absoluta submissão à
Lei.
Aqui nos congregamos
para manifestar-te obediência completa e horror a tudo que te atraiçoe, a tudo
que te conspurque, a tudo que te comprometa.
À mentira e à injúria.
Ao furto e à violência.
Ao compromisso e ao
negócio. Ao embuste e à opressão.
Recebe, Bandeira, o
nosso juramento: se não pudermos ter-te por manto, desejamos-te por sudário! Sê
bendito, Pavilhão Brasileiro!"
Jânio Quadros (1917-1992)