O produtor colonial, por
inúmeros citadinos, vê-se tachado como ingênuo e modesto.
Ele, de maneira geral, mantém-se alheio as malícias e maracutaias
urbanas. Este procura ocupar o tempo e preocupar-se com os afazeres das criações
e plantações (vivendo em contato com a natureza).
Uma entidade
cooperativada, com a contínua valorização do produto leite, resolveu fazer um
projeto de financiamento de vacas. O objetivo consistia em elevar o nível
genético dos planteis nos tambos. Os colonos, com alguma produção leiteira,
poderiam inscrever-se no programa. Os técnicos, do departamento agro-técnico,
analisariam as qualidades dos animais e as condições econômicas dos
interessados. As vacas viriam compradas dos melhores tambos e transferidas aos
produtores inscritos.
Um humilde rural, com
alguma dezena de litros, participou da inovação. Ele, através dos técnicos,
ganhou o aval da entidade e as ditas vacas foram-lhe trazidas. Estas, belos
exemplares da raça holandesa, vieram enobrecer o meio colonial e a propriedade
particular. A produção de leite, de imediato, saltou na conta do produtor. Os
terneiros, na primeira oportunidade, viram-se gerados (na proporção do cio). A
finalidade consistia em criar futuras produtivas novilhas/vacas. O melhoramento
genético e produtivo, em síntese, funcionou a contento.
O produtor, em função das
dificuldades econômicas familiares e esperteza financeira, deixou de honrar as
prestações do débito. Este extraia os dividendos das vacas e nada de pagar os
encargos. A escassa produção não cobria os exorbitantes valores assumidos. A
entidade, depois de vários avisos/recados trazidos pelo leiteiro, enviou um
ultimato de acerto de contas caso contrário os animais
seriam reaprendidos/reavidos. A alternativa, como primeira opção, consistiu
“em mostrar a cara” para ter uma conversa com o presidente da entidade.
O chefão e o fulano, no
gabinete da entidade cooperativada, tiveram uma conversa franca (“para colocar
os devidos pingos nos is”). A cooperativa, diante da carência de quaisquer
pagamentos, queria uma indenização (em função do uso prolongado dos animais). O
colono, durante uns meses, havia subtraído leite e terneiros. As vacas, com
vida útil limitada a poucos anos, obrigaria a entidade a cobrança de algum
ressarcimento. O discurso do maioral foi nessa ênfase.
O rural, no decurso da
conversação, colocou sua tônica. Este, pelo senso de justiça, concordava em
pagar alguma reparação (pelo ônus de uso prolongado de uns quatro bons anos).
Ele, como criador e tratador, também tinha sua necessidade de cobrança de
dispêndios. A cooperativa deveria compensá-lo pelo trabalho de cuidar e o trato
animal dispendido neste longo espaço de tempo. A solução, numa choradeira e
lamúria mútua, ficou na típica troca/tradicional “elas por elas”.
Os amigos, conhecidos e
vizinhos admiraram-se da astúcia e ousadia do produtor. Ele, um pacato morador,
“conseguiu passar a perna no cara mais esperto da comuna”. Alguém finalmente
conseguira encampar e ludibriar o presidente da cooperativa. A
entidade mostrava-se sempre a parte mais forte e o produtor a parte mais
frágil. A corda, pela experiência, arrebentava sempre na parte mais fraca e
dessa vez fora uma exceção. Poucos davam-se o direito de falar de igual para
igual com uma autoridade desse porte.
Bons argumentos derrubam
um conjunto de explicações e palavras. Os modestos, nos confrontos teóricos,
costumam advir com ideias e opiniões determinadas e meditadas. Contratos mal
elaborados não passam de aborrecimentos e prejuízos monetários. Comprovantes
são meros papéis e não compram as necessidades na esquina.