Um evento especial
marcou determinado cenário colonial. A energia elétrica, na maioria das casas,
tinha sido instalado a uma boas décadas. Alguns poucos moradores, retirados da
estrada geral, careciam de ainda instalá-la. A administração, numa parceria entre
os governo (das três instâncias), resolveram fazer um projeto de auxílio aos
carentes. Estes, numa espécie de cortesia ou baixo custo, ganharam acesso ao
bem da modernidade. Eles, como rurais, precisariam ter os idênticos direitos
aos demais cidadões urbanos.
Determinada
administração municipal, na visita do governador (de idênticos partidos),
resolveu promover uma cerimônia ímpar. Esta consistiu em apagar o último
lampião no município. O governador, em vésperas de reeleição, faria-se presente
como chefe (numa visita oficial transvestida de política). Uma residência, de
fácil acesso e carente da energia (com moradores simpatizantes da corrente
partidária), foi escolhida de forma proposital/a dedo. Uma data e horário foram
marcados para o cerimonial momento. O entardecer, próximo ao escurecer,
definiu-se para o evento de assopro da aposentadoria do lampião e da lamparina.
Uma circulação de
veículos ímpar tomou conta das cercanias da residência e no interior da
localidade. A imprensa, escrita e falada, fazia-se presente ao acontecimento
para o registro. Os amontoados de cabos eleitorais e cargos de confiança, numa
convocação extraordinária, fizeram-se presentes (para aplaudir e dar
público). Um espetáculo excepcional, digno dum “circo romano em dias festivos”,
para divulgar e enaltecer as conquistas e louros das administrações. Abraços
aqui e acolá, cumprimentos lá e cá, discursos daquele e desde,
aplausos estridente e pausados, gritos de euforia e simpatia sucederam-se
no ambiente.
Os gestores cedo
fizeram referências aos polpudos investimentos e outras melhorias no bem
comunitário. As empresas recém instaladas, como perspectivas de arrecadação e
empregos, foram mencionadas. A questão trabalho, para filhos e netos, certamente
não seria nenhuma dificuldade futura. As gestões públicas, na fala dos
maiorais, constituíam se umas aparentes maravilhas. As carências e
endividamentos, em nomes e números, foram “deixados nos gabinetes e varridos
debaixo dos tapetes”. A certeza da reeleição, conforme as pesquisas
preliminares, pareciam indicar vitória da situação. As coligações, numa espécie
de frente para o grande pleito, continuaram sendo acertadas e discutidas com os
caciques dos partidos.
O evento, de assopro
das luminárias, numa altura tomou vulto na proporção da presenças das
autoridades e correligionários. O espaço mostrava-se pequeno para tamanho
número de pessoas. Uma anciã, assustada com toda essa movimentação e sentada
quieta num canto da sala, externou curiosa pergunta num determinado momento.
Ela, em meio aos muitas caras estranhas e novas, dirigiu-se a uns conhecidos
para interrogar. A idosa, no seu dialeto germânico do Hunsrück, inquiriu: “-
Aquele barbudo e grandão (o governador), todo engravatado e centro das
bajulações, é o Geisel?” (uma referência ao antigo Presidente da República
Ernesto Geisel). Os políticos, em cerimônia e ladainha, eram justamente
adversários ferrenhos/opositores da outrora ditadura militar. Uma filha logo
fez sinal para silenciar!
O prefeito, para
reforçar a média por verbas, falou em ser o último lampião. Uma grosseira
falácia e disso sabia perfeitamente. Outras residências, no interior das grotas
do município afora, continuaram a iluminar a escuridão com luz de lamparina. A
aposentadoria não tinha sido dessa vez. A comunidade passou-se outra década até
conseguir descartar os centenários lampiões e lamparinas. Os
resquícios do atraso, no primeiro fraquejo da tecnologia, ressurgem dos
esconderijos e esquecimentos. As dispensas e porões, no interior das
instalações, escondem relíquias (como peças de museu e precaução ao colapso do
sistema elétrico).
Uma realidade comum,
na política, consiste em montar circos para enaltecer realizações dos gestores
públicos. As reeleições, por compras e não por obras, revela-se uma
prática política corriqueira nas democracias. Políticos não fazem mais que suas
obrigações, porém vendem imagem de generosidade e trabalho (com os recursos do
erário). Inúmeros funcionários, em função dos polpudos salários,
fazem papeis de mercenários e ridículos com razão de angariar os ganhos.
Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”
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