Um
certo advogado, por anos, deixou o filho estudar advocacia. Este, como tradição
familiar, abraçaria uma sina profissional. Três gerações seguiram-se na atuação
das leis. O sobrenome fazia história com a eficiência no serviço.
Os
moradores, do pacato lugarejo, sabiam procurar os familiares (na proporção de
“envolverem-se nalguma fria ou querela legal”). O genitor, como homem com trato
com a lei, sabia fazer respeitar os direitos civis (diante dos argumentos e
poder das autoridades). O advogado, em várias oportunidades, tinha concorrido a
cargos públicos, exercido mandatos, viajado muito (neste mundo afora)... Ele,
portanto, conhecia as artimanhas, gentes e lugares (“cidadão curtido nesse velho
mundo”).
O
filho, estudante conceituado numa universidade pública federal, queria somar-se
a fama. O sonho e a realização, com a aposentadoria do ancião, consistia em
assumir o escritório de advocacia. Os ganhos do serviço dariam para manter a
dignidade e qualidade de vida. Este, em meio a sua ingenuidade e imaturidade,
achava-se deveras astuto e esperto. Ele fazia questão de revelar esta
habilidade e vocação. Afinal, passar
anos nos bancos escolares não é privilégio e “prato de quaisquer um”.
Os
eventuais concursos públicos, no ramo do Direito, viam-se também acompanhados e
efetuados (com razão de aprovar e assumir algum posto mais elevado nas instâncias
da República). Este, como desejo geral, queria ganhar o dinheiro fácil e graúdo
(sem maiores aborrecimentos e atropelos). A solução, na proporção de não haver
concursos e aprovações, consistia em exercer a profissão no seio do escritório.
O
cidadão, formado nos estudos, assumiu processos do genitor. Havia algum
especial, relacionado à disputa de terras, de duração interminável. As partes
envolvidas, de maneira nenhuma, chegavam a um denominador comum. O processo
mantinha-se conhecido nas instâncias do Judiciário. Os moradores, nas conversas
informais, falavam da infindável querela. Esta, nos anos de disputa e intriga,
tinham consumido somas expressivas de honorários das partes.
O
advogado jovem, com os últimos e vastos conhecimentos (assimilados em termos de
legislação com os doutores), queria mostrar eficiência e serviço. Queria, em
síntese, demonstrar a profissionalização e fazer o nome na praça!
O
genitor, com a aposentadoria, procurou tirar umas boas e prolongadas férias.
Ele, com sua adorável e conceituada esposa, foi fazer aquele cruzeiro pelo
Caribe. Um sonho de décadas e espécie de segundas núpcias. O casal ficou umas boas
semanas fora do lugarejo (para arejar a cabeça e conhecer nova gente). O filho,
no retorno, tratou de falar logo com o pai (advogado aposentado).
Este,
na sua sabedoria magistral, estufou o peito para dizer: “– Pai! Lembras daquele
processo de terras? Aquela disputas de décadas? Querela infindável entre as
famílias das colônias! Pude, em poucos dias, dar um desfecho nesta disputa.
Quis demonstrar-lhe o conhecimento e eficiência! Fiz em poucos dias aquilo que
não conseguistes dar termo em anos!”
O
pai, assombrado e surpreso, arregalou os olhos. Este, para o imaturo filho,
disse: “- Confirmou-se a minha suposição de seres ingênuo e inconsequente.
Achei-lhe bem mais astuto e esperto! Terminastes o processo? Como irás agora ‘ordenhar
a vaca’? Matastes o animal ou, em outras palavras, eliminastes a galinha dos
ovos de ouro? Precisas encontrar outros trouxas para ganhar o bom e suado
dinheiro (com suas burrices de mostrar a força do Direito aos vizinhos)?” O
rebento não soube contradizer os argumentos e “caiu-lhe o crédito do
funcionamento da Justiça”.
A esperteza e
inteligência mostram-se muito relativas. Uns, em certos dilemas, tem o maior
interesse em prolongar e não resolver nada! Quê seria de certos profissionais
caso não existisse os ingênuos (achando-se muito espertos)? Astutos e vividos
são os pacatos cidadãos carentes de envolver-se em disputas e querelas. Preze teu
suado dinheirinho em benesses e mimos (em vez de desperdiçá-lo em disputas vãs).
Uma conversa franca e paciente, entre as partes antagônicas (de olho no olho),
poupa aborrecimentos e resolve divergências.
Guido Lang
“Singelas Histórias
do Cotidiano das Colônias”
Crédito da imagem: http://pisdc.com.br