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domingo, 23 de setembro de 2012

O convite do livro

     "O livro tem vida? O registro é uma convocação! Um convite à descoberta! A obra está ali inerte e só ganha vida quando é apreciada, folhada, lida... Está exposta para isso, esperando o leitor anônimo que  a manuseie e que o leia até a orelha. Aliás, a orelha é um bom referencial para saber do que trata a obra. As frases, as histórias e as palavras só ganham vida nas descobertas e imaginações do leitor. Esta precisa dos apreciadores. É a sua seiva. O sangue daquelas páginas brancas e virgens. Quem conhece o livro, descobre um tesouro; caminha pelas estradas das experiências e vivências humanas, comunica-se com as gerações no tempo..."

Autor Desconhecido

O teste da vocação agrícola


     Qualquer profissão encontra gente de todos os interesses e tipos, quando levam ou não jeito à atividade econômica. Um fato idêntico ocorre no meio colonial, quando uns seguem o trabalho por gostar ou o seguiram em função da mera tradição rural familiar. Faltou-lhes oportunidade maior para abraçar profissão mais rendosa. Olhos atentos, apreciando as entrelinhas dos estados da criação, pátio e plantações, vislumbram o espírito vocacional.
   Os vocacionados, gostam daquilo que fazem, encontram meios de inovar o sistema produtivo, tentam aproveitar ao máximo as áreas disponíveis, diversificam criações e plantações, fazem “corpo firme” para produzir, vesse-os continuamente no batente. O desanimado pouco caso faz das coisas e do estado de apresentação das instalações e moradias. Costuma labutar com razão de assegurar a subsistência, no que carece de ambição maior. A diferença, a longa distância, permite vislumbrar o cenário, enquanto o primeiro mantém o lote cultivado e produtivo; o segundo tomado pelos brejos e matos (com ilhas de culturas esporádicas).
     Um detalhe marcante, a primeira vista, sucede-se com o esterco (de aves, gado e porcos). O caprichoso e dedicado mantêm uma contínua falta do material, quando não o consegue acumular. Precisa-o para adubar áreas de plantação, quando poupa dispêndios volumosos com a compra dos adubos. As estrumeiras costumeiramente andam vazias e este lamenta o fato. O desestimulado e desleixado acumula quantidades, que perdem-se na ação das chuvas e ciscar das aves. O produto dificilmente ganha uma destinação agrícola, quando encaram-no como “tremendo empecilho”. Várias propriedades, na primeira oportunidade, salientam-se neste detalhe, quando uma “semi-montanha” formou-se nos fundos das instalações.
     O colono esclarecido, conforme a tradição colonial, sabe que labuta com as bênçãos divinas, quando dá uma real destinação aos dejetos animais. O solo produz, todavia quer também sua retribuição para continuar fértil. O maior patrimônio colonial não pode ser exaurido em função do ônus de recuperá-lo. O indivíduo, para extrair reais conclusões, precisa observar muito mais os detalhes e entrelinhas das situações do que as falas e os enfeites. Os reais fatos dificilmente conseguem esconder os muitos detalhes.

Guido Lang
Livro “História das Colônias”
(Literatura Colonial Teuto-Brasileiro)

O bom conselho


     Cinco gerações ficaram a usufruir de determinada área agrícola, quando essa, a cada ano, recebia de duas até três culturas. Batata, mandioca, milho e a vassourinha ficaram a produzir no contexto de um espaço muitíssimo fértil. Os plantadores continuamente a devassaram com os arados (de bois), com razão de “rasgar” este excepcional solo. Animais e homens, num cortejo ímpar, percorriam os regos, que viam-se tomados pelas pedras e vegetações. Uma gama de espécies (de inços) parecia desenvolver-se em função da umidade retida nas rochas, que brotavam no sabor da superfície. Os desbravadores sofriam com a inconveniência, porém a magnitude dos frutos justificava a labuta insana.
     Achegou-se, um belo dia, um conhecido, que, através dos anos, tornou-se muitíssimo amigo. Este, vendo os sacrifícios despendidos, no contexto da roça, disse uma prática agrícola. Recomendou a cada ano limpar parte da propriedade do excesso de pedras, quando possibilitaria a mecanização. Falou: “-Parceiro! Tira a inconveniência das rochas e coloca trator nisso! O esforço, deveras oneroso no início, justifica a economia de esforço lá adiante. Dá uma contribuição a teu filho, que aspira continuar no teu empreendimento. As pedras extraídas organiza como cerca com razão de serem curvas de nível a conter a erosão”. 
    O colono pensou e repensou do explanado. Procurou, no período das entressafras, colocar mãos a obra, quando diversos dias avolumou as pedras. Quantidades ímpares, numa “paciência de Jó”, foram carregadas e levadas na direção dos valos. A coluna e os ossos, no desfecho de cada empleitada, pareciam estralar. A diferença de visual, no lugar, fazia-se sentir e cedo colocou-se o trator no lugar da boiada. A lavração, gradiação e semeadura mecânica fizeram uma tremenda economia de tempo, quando a área, no contexto da propriedade familiar, tornará-se a mais nobre. Vizinhos elogiaram a mudança e facilidade do aproveitamento do lugar, que tornara-se o cartão postal da unidade produtiva. Um protótipo para outros tomarem idêntico exemplo e ele prosseguir limpando todos os espaços agrícolas da propriedade.
     Um singelo conselho, dado de coração, ocasionara uma “revolução agrícola”, quando mudou toda uma mentalidade de trabalho. O nome do amigo, como agradecimento, foi externado aos “quatro ventos”. Os exemplos, ideias e sugestões, acrescidas das práticas, revolucionam o mundo!

Guido Lang
Livro “História das Colônias”
(Literatura Colonial Teuto-Brasileiro)

Crédito da imagem: http://ruygessinger.blogspot.com.br/2011_07_01_archive.html 

sábado, 22 de setembro de 2012

Uma tradição centenária


     Os imigrantes, enfiados no interior da floresta, obrigaram-se a estudar as espécies. Conta-se, pela tradição oral, que consumiam as frutas que as aves digeriam com razão de não comer inconveniências. O aprendizado cedo despertou o interesse excepcional por algumas espécies nativas, que faziam “a festa da fauna”.
     As espécies, como amoras, araticuns, cerejas, guabijus e guabirobas, foram poupadas dentro das possibilidades da devastação generalizada. A qualidade das frutas, para o consumo próprio e manutenção de espécies, via-se excepcional, no que cedo ganharam espaço nos pátios e pomares. Algumas, com bom sombreamento, mantinham-se árvores ornamentais, quando, no rigor do verão, podia-se sentar para conversar e receber visitas. As famílias, nas épocas próprias, podiam degustar alguma fruta silvestre, no que costumeiramente “fazia a alegria da gurizada”. Os apicultores improvisados viam a dádiva divina quando os insetos tinham oportunidades de produzir mel. Aves, como angolistas, galinhas, gansos, marrecos, perus e pombos, podiam degustar sobras. Algumas famílias, por tradição de gerações, mantinham a prática de manter algumas árvores especiais de guabijus e jabuticabas. Elas eram marcas de assimilação, de princípios ambientais da América, quando, na época da frutificação, bandos de araquãs e sabiás invadiam os pátios nas caladas dos dias.
     Os moradores, no interim da labuta, davam-se o tempo de assistir o espetáculo das aves assim como degustar uns bons frutos. Uma singela alegria, junto a outras, do espetáculo da vida rural, que tem suas dificuldades e também seus encantos. Uns poucos, com a maior consideração, mantêm ativo a cereja, jabuticaba e guabijus nos pátios na proporção do espaço disponível permitir.
     Princípios e valores de uma época subsistem na discrição do quotidiano, quando guarda-se reminiscências deste passado ímpar e mantêm-se resquícios da tradição. Algumas jabuticabas e guabijus subsistem ao tempo, enquanto os reais cultivadores, na sua maioria, “jazem no silêncio das suas tumbas” e o “pó voltou ao pó”.

Guido Lang
Livro “Histórias das Colônias”
(Literatura Colonial Teuto-Brasileira)

Crédito da imagem: http://www.panoramio.com/photo/18476018

A súplica do livro


     "Não manuseie-me com as mãos sujas.
      Não escreva em minhas páginas.
      Não rasgue e nem arranque minhas folhas.
      Não apoie o cotovelo sobre as minhas páginas durante a leitura; não deixe-me sobre cadeiras ou lugares que não sejam meus; não deixe-me com a lombada por cima; não coloque entre minhas folhas objeto algum mais espesso que uma folha de papel; não dobre os cantos de minhas folhas para marcar o ponto que parou, use para isso uma tira de papel ou marcador apropriado; terminada a leitura, devolva-me ao lugar certo ou a quem deva guardar-me; e ajude a conservar-me limpo e perfeito e eu o ajudarei a ser feliz".

Autor Desconhecido

Prece irlandesa

"Que a estrada se abra à sua frente. Que o vento sopre levemente às suas costas. Que o Sol brilhe morno e suave na sua face. Que a chuva caía de mansinho em seus campos. E até que nos encontremos de novo, que Deus guarde-lhe na palma das suas mãos".

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Um propósito literário


     O objetivo desta série de artigos, versando sobre o cotidiano colonial, tem um propósito ímpar. Visam criar uma literatura colonial teuto-brasileira, no qual têm-se carência de registros. Pode-se, ao longo da colonização, pesquisar inúmeros dados da imigração de famílias, de locais, das genealogias, dos conflitos... O contexto, no entanto, pressente-se de uma ausência: o dia a dia do colono no interior da propriedade. Qual a cultura empírica acumulada ao longo das décadas e gerações de ocupação do espaço? Criou-se todo um conhecimento, que na prática não ganhou maiores apontamentos.
     Procura-se, como filho de colono, chacareiro e experiência urbana, iniciar estes escritos, que possam criar uma literatura para estudos acadêmicos e deixar “pegadas” da mentalidade de vida. A prática colonial, na real, consiste numa cultura marginal, que, em inúmeras ocasiões, viu-se denegrida e “causa de chacota generalizada”. Mostra-se riquíssima em função da mescla de valores germânicos com os latinos, quando precisou-se encontrar meios próprios a adaptação ao meio da América Meridional. O elemento teuto, como forasteiro jogado entre a floresta, necessitou criar uma civilização própria, quando viu-se semi-abandonado nas encostas e vales das terras sulinas (cobertas de uma vigorosa vegetação). A convivência, em pacatas localidades/picadas, num ambiente de intensa solidariedade, foram criando um conhecimento empírico que encontra-se desprezado ou ignorado pelos “doutores/especialistas das universidades”. Cabe-nos como obrigação com os ancestrais, eternizar os acontecimentos e conhecimentos nos apontamentos literários. Inúmeros, ao longo do tempo, passaram despercebidos/ignorados como se nunca tivessem existido em função da carência de registros. Precisamos fazê-lo como filhos da terra, quando, em função da rede mundial de computadores, a divulgação tornou-se fácil e rápida. Agrademos aos apreciadores dos singelos apontamentos, que são o início de “vôos maiores” rumo a eternização de um meio de vida.
     Necessita-se fazer registros para que esta civilização não passe em vão na História. A contribuição maior vem no sentido de fornecer alimentos para abastecer as mesas urbanas. A agricultura familiar de subsistência é a base de criação e plantação/manejo da terra!

Guido Lang
Livro “História das Colônias”
(Literatura Colonial Teuto-Brasileiro)