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sexta-feira, 15 de março de 2013

Umas singelas peças


Convento São Boaventura - Imigrante/RS, construído todo em pedra-grês.

As pedras, por milênios, jaziam adormecidas nas brutas e cobertas minas. Os materiais, na profundidade do tempo, achavam-se numa aparência de eternas (nas inércias e reservas).
Uns forasteiros, no contexto dos primórdios da colonização e ocupação colonial, achegaram-se numa certa ocasião. Estes senhores, com habilidade finita e paciência ímpar, passaram a destacar e rachar lascas (em forma de variadas peças e tamanhos). Umas escassas ferramentas (a base do aço e ferro maciço), manipuladas por milagrosas e práticas mãos, extraiam estranhos e variados quadrados. Estas peças, conforme as finalidades de uso, mantinham dimensões e formatos diversificados (de algumas dezenas de centímetros em altura, comprimento e largura). Os objetivos das extrações consistiam numas nobres funções e missões nas construções.
Os conjuntos de milhares de peças, em dias, semanas, meses, anos e décadas de extrações, viam-se destacados e selecionados (conforme as necessidades próprias). Os pedaços das lascas, umas caricaturas e miniaturas comparadas as minas de pedras grês, foram sendo arrastados e carregados. O trabalho animal e humano, na direção dos espaços das obras, conheceram dedicação, habilidade e inteligência. Os locais, costumeiramente um pouco distantes das estradas gerais e no interior das propriedades, ganharam dimensões de instalações diversas. Alguma visão panorâmica, como encostas das colinas (na proporção de haver água), tinham preferência nos locais de montagem.
Algumas centenas de milhares de unidades,  destacados do conjunto, foram sendo amontoados e empilhados cuidadosamente e pacientemente nas muitas picadas (localidades). Algumas peças, as mais robustas e volumosas, tiveram as funções de alicerces. Elas, no contexto geral, precisaram comportar as mais leves. As mais leves ganharam a dimensão de paredes. Umas quatro, com subdivisões no centro, tomaram sentido das moradias. Edificações sólidas, desafiadoras do tempo, fizeram-se em função da dureza dos materiais. Os calores, chuvas, frios e  ventos viam-se suavizadas no contexto dos abrigos (edificados nas matas subtropicais). Umas três a quatro gerações abrigaram-se e criaram-se nas construções (durante um período de muitas décadas).
As construções obsoletas, em função das peças, foram desmontadas e remontadas. A modernidade adveio para enterrar modelos de vida do passado. Os materiais, de modo paciencioso, foram novamente desmontados. Umas mãos, agora da descendência, trataram de carregá-las em potentes veículos. Elas, em lugarejos variados, foram descarregados e reconstruídos. Estas, como no passado, mantiveram suas funções.
Outros humanos, como velhas cozinhas e salas, adquiriram-os por míseros trocados. Alguns enamorados, como jovens casamenteiro, continuaram a epópeia humana (de edificar casas e constituir famílias). Estes, com ajuda de auxiliares e pedreiros, refizeram a metódica labuta da montagem e reconstrução. As preocupações, como na origem, consistiam em fazer mais com o menos dos recursos (com razão de fazer render o dinheiro). Outras semanas e meses, de esforço e suor, foram necessários para fazer brotar habitações em novos moldes.
As pedras, legados dos ancestrais, continuaram sua nobre e  sublime missão de abrigar das intempéries do tempo. As moradias, noutras três a quatro gerações, certamente tem a função de cuidar e guardar humanos. Estes materiais vêem-se encaixados e readaptadas as necessidade da modernidade. Algum reboco, para esconder o cru, escondem as muitas e variadas peças. As pesadas e sólidas rochas, no contexto dos manejos das construções, mostraram-se judiadas e penosas.
As pedras reformuladas, umas vez empilhadas, formaram um conjunto ímpar. Umas robustas edificações desafiam o tempo e dão conforto e segurança aos proprietários. Os quebradores, no processo da colonização, passaram no silêncio do anonimato (na proporção da ausência ou carência de registros). A tradição oral, nas décadas sucessivas de sucessão das gerações, iriam esquecendo nomes e práticas dos autores das façanhas.
Se as peças, num conjunto de roda viva, pudessem falar da história. A grandiosidade do gênio humano, no seus muitos anonimatos, seriam dignos de admirações e registros. Como ocorreram as extrações? Quais as ideias e filosofias das pessoas envolvidas? Que modo de vida ostentavam? Quem eram os reais construtores? Algumas funções, nos sucessivos futuros, continuarão sendo dadas às pedras. Estas, umas vez destacadas e selecionadas, ganharam uma serventia ímpar. Estudiosos, nas posterioridades, elaborarão teorias e tratados sobre técnicas de construção.
Uma realidade, comum nas colônias, consiste em desmontar antigas construções e remontar os materiais em novas edificações. As pedras, no tempo, desafiam as gerações  na proporção de servirem a muitas humanos. As peças, talhadas com habilidade e paciência, tem uma continua serventia nas propriedades coloniais.

Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”


Crédito da imagem:http://www.turismo.rs.gov.br 

quinta-feira, 14 de março de 2013

Colonização Westfaliana


As dificuldades de sobrevivência, por volta do ano de 1868, foram muitas na Westfália/Prússia. Os impostos eram extorsivos em relação aos baixos rendimentos. O Estado nacional alemão, em formação, precisava de recursos para fazer frente às guerras de unificação (de Bismarck contra a Áustria em 1864, Dinamarca em 1866 e França em 1870). O recrutamento militar era obrigatório e temido. O excessivo crescimento populacional tornava os recursos financeiros escassos. A falta de terras aráveis, às camadas pobres, um problema econômico-social. Os latifundiários concentravam os solos  e agregados e semi-escravos viam-se comuns. A falta de oportunidades, a propaganda da abundância de terras na América, a substituição do trabalho artesanal pelo mecânico foram outras causas do êxodo...
As levas de despossuídos queriam uma ocasião para o pessoal procurar novas oportunidades de ascensão econômica e abandonar a Alemanha assim como conferir as “notícias da fartura americana”. Estas apareceram com o pastor evangélico Johann Friedrich Wilhelm Kleingünther. Este veio ao Brasil e conheceu, em 1866, a próspera Colônia Teutônia. Resolveu, consciente das dificuldades de vida de muitos dos seus conterrâneos, espalhar a “boa nova”. As cartas da fertilidade do solo, das facilidades de compra de terras, abundância das riquezas naturais (caça, madeira e pesca), clima ameno e da colonização de evangélicos luteranos em Teutônia criaram uma espécie de febre de emigração.
Estas notícias, conforme Klaus Becker em "I Colóquios de Estudos Teuto-brasileiros", pág.  222 e 223, fez com que em 14 de agosto de 1868 viesse a primeira leva de colonos westfalianos. Eles vieram do Rio de Janeiro a Porto Alegre com o vapor “Proteção”; eram em número de quarenta e uma pessoas e conhecidos do pastor Kleingünther. A leva, de Porto Alegre a Taquari, foi embarcada no dia 20 de agosto de 1868. O trajeto de Taquari a Teutônia, através dos campos selvagens e matos, foi percorrido com carretas e carroças de mulas pelo carreteiro e comerciantes/diretor da colônia particular Karl Arnt.
A relação dos pioneiros foram Heinrich Howeler e esposa, Heinrich Eggers e família, Elisabeth EggersErnst HachmannFriedrich LiedeWilhelm Schonhorst e família, Wilhelm Hasenkamp e Friederike BrockmannFriedrich BrockampFriedrich Neuhaus e  esposa, Hermann Pohlmann e Wilhelmina NeierFriedrich Wilhelm Knebelkamp e esposa, professor primário Johann Heinrich Behne e família. Outras levas, entre os anos de 1868 a 1872, seguiram e trouxeram aproximadas trezentas famílias.
Os colonos vieram principalmente de lugares como Lengerich, Tecklenburg, Ostenberg, Kappeln, Landbergen, Lotte, Osnabrück, Gaste, Westerkappeln, Leeden... Estes, na Colônia Teutônia, constituíram uma colonização homogênea. Os pioneiros instalaram-se primordialmente nas picadas Franck, Neuhaus, Schmidt, Clara, Krupp, Frederico Guilherme, Berlim, Moltke... Os moradores introduziram o dialeto do sapato de pau, que mantém referência a sua habilidade de confeccionar e usar o sapato de pau (em função das dificuldades econômicas e rigores do clima).
Os imigrantes westfalianos destacaram-se pelas atividades e entidades culturais. As escolas comunitárias pipocaram assim como os esteios dos templos religiosos. O canto coral, sociedades de tiro, grupos recreativos e de leitura bíblica tornaram-se comuns no seio colonial. Uma instituição, muito conhecida, foi criada pelos ex-combatentes das guerras de unificação. Tratou-se da Sociedade dos Atiradores da Linha Clara/Teutônia.
Os elementos westfalianos sobressaíram-se pelo espírito produtivo. Excepcionais criações e plantações invadiram o espaço da outrora aparente impenetrável floresta. O instinto de econômico e trabalhador são aspectos salientes no cenário comunitário e os municípios resultantes, das suas iniciativas, destacam-se nos elevados índices de desenvolvimento humano. Algumas localidades, num cenário ímpar, parecem abrigar cidades de aviários, chiqueiros e tambos.

Fonte: Guido Lang, O Informativo de Teutônia n° 18, dia 25.11.1989, pág. 02 (texto reescrito).

Crédito da imagem: http://www.panoramio.com - Foto da Prefeitura de Westfália/RS



O conhecimento da legislação



Uma pacata senhora, advinda do interior, bateu numa fábrica de calçados. Ela pediu emprego na linha de produção. A empresa, com baixos salários, precisava de gente em função da alta rotatividade. A oportunidade de trabalho foi dada ao pedido. Os ganhos, apesar de baixos (em função dos muitos descontos de encargos), era melhor do que estar desempregado/parado. A inatividade consumia eventuais sobras familiares.
Umas boas semanas transcorreram a título de estágio e experiência. O trabalho, a princípio, parecia agradar as duas partes. O negócio, de contratante e contratado, tomou o rumo da efetivação no cargo/posto. As partes pareciam estar a contento com os mútuos resultados.
A funcionária, numa altura, ausentou-se por três dias seguidos do emprego. A empresa, através da gerência, preocupou-se com a ausência (em função de nalgum sucedido ímpar). Alguma anomalia familiar certamente tinha motivado o fato. A fulana, contrastando com a prática da empresa, absteve-se de dar a tradicional explicação/justificativa. A norma, nestes casos imprevistos, era de falar com a chefia e “sanar eventuais arestas”. A cidadã, num descaso e petulância, deu a mínima aos interesses e necessidades da empresa.
A gerência, num momento, foi ao encontro da fulana para uma conversa/diálogo. Os chefes queria entender as repentinas ausências. A funcionária, de forma categórica e grosseira, externou: “- Conheço bem as leis trabalhistas! Sou também formada em advogacia!” A decepção e surpresa foram ainda maiores. A gerência desconhecia esse singelo detalhe (na hora da efetivação). O sigilo profissional havia sido escamoteado!
O estudo, em ambientes de ar condicionado e computadores, não consegue atender a todas as demandas do mercado trabalhista. Uns muitos, apesar da parafernália de máquinas (de todos as funções e tipos), precisam continuar firmes na linha de produção (ocupados com tarefas braçais). A formação universitária, após a conclusão de curso, deixa o estudante de mãos abanando e a necessidade obriga a trabalhar (começando por baixo). Inúmeros trabalhadores procuram emprego em vez de trabalho (o certo seria trabalho para ter emprego).

Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano Urbano”

Crédito da imagem: http://www.melhoradvogado.com.br

quarta-feira, 13 de março de 2013

Uma curiosa dúvida


Um pacato colono, como marca registrada, mantinha a acirrada curiosidade. Ele, como agricultor, adorava alguma conversação e novidade. Este, para tal finalidade, possuía um infindável tempo. O trabalho, na agricultura familiar de subsistência, poderia esperar (na proporção de haver oportunidades de boas e interessantes conversas e diálogos).
Os acontecimentos comunitários, como momentos de convivência, não deixavam de passar em branco. Estes, para não desperdiçar os rumos dos acontecimentos, ganhavam uma atenção e dedicação especial. A despreocupação, em termos gerais (com a propriedade), levaram-no a ser um modesto morador. Uma vida familiar singela e sem maiores luxos. O acúmulo de sobras foi inexpressivo (nas várias décadas de existência).
Um determinado encontro de cooperativados, na entidade comunitária local, ocorreu num certo dia. A conversa informal, antes e após a reunião, sucedeu-se entre os vários participantes. Os assuntos versados, de maneira geral, eram os mais diversificados. As criações e plantações, como produtores rurais, ganhavam a tônica das atenções e preferências. Os colonos-associados, aqui e acolá, relataram suas experiências e vivências.
O curioso, num determinado instante, conversou com o presidente da cooperativa. Este, como chefe maior e líder regional, era “aquele que fazia acontecer/chover”. O rural, como de práxis, queria satisfazer mais uma dessas suas ímpares curiosidades. Este, como velho amigo e conhecido, perguntou: “- Fulano de tal! Como se explica o fato? O teu irmão trabalha como produtor rural. Este, apesar da dedicação e trabalho, convive com as constantes dificuldades financeiras. O dinheiro auferido mal dá para viver! Ele, nesses anos todos, judiou-se e não acumulou nada de expressivo. A realidade econômica, como irmão/mano, contrasta com o senhor. As pessoas falam que você é um homem muito influente e rico!”
O camarada presidente, na sua maneira de ser curto e preciso (na tradicional franqueza), deu uma leve gargalhada e suspirou fundo. Este, sem floreios e rodeios, explicou: “- Esta situação é fácil de compreender e entender! O meu irmão, como homem da terra, costuma labutar com uma junta de animais. Eu, como administrador e contador, trabalho com mais de dois mil bois! A acentuada diferença nos números resulta no acúmulo do numerário financeiro!”
O ouvinte ficou assombrado e estarrecido. Ele, como os muitos moradores associados, faziam parte dessa boiada/manada. A acentuada diferença, no acúmulo de sobras entre as partes, era a comprovação dos fatos. A sabedoria consiste: quem trabalha, de forma animal e braçal, não tem maior tempo de pensar em ganhar dinheiro. O segredo monetário não está na produção dos artigos e sim na intermediação das mercadorias. As diferenças econômicas, entre governados e governantes, cedo salta aos olhos (como diferenças de classe/entre ter e não ter).
O excesso de curiosidade expõem os autores ao ridículo. As perguntas direcionadas aos espertos ainda não custam; as verdades (relativas) porém nem sempre são relatadas. Poucos são aqueles que conseguem conviver com as dúvidas. Umas boas respostas assumem valores de umas valiosas pérolas.

Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”

Crédito da imagem: http://agroinformacao.blogspot.com.br

terça-feira, 12 de março de 2013

Um leve engano


Uma penca de abelhas, em forma de enxame, assentou-se no pé de cereja dum vizinho. Uma singela árvore foi o lugar próprio da parada e repouso. A comunidade, num processo migratório, recém havia abandonado a original colmeia. Esta queria ares novos com razão de procurar o seu próprio caminho.
O colono apicultor, com uma dezena de caixas iscas instaladas, fez uma aparente vista grossa. Este, pela experiência e sorte, dava-se como certo a escolha de alguma armadilha (como moradia). Ele não queria ter o trabalho de apanhar o enxame (numa certa altura da planta). Uma dezena de atrativos, em número de chances, pareciam-lhe suficientes como sorte. Este refletiu e esperou: “- a comunidade, com carências de opções de ninhos, vai escolher as minhas atrativas e sólidas caixas!” Este cedo conheceu o belo e leve engano!
Os insetos, próximo a metade da manhã (com o aquecimento solar), “foram ao mundo”. Elas, pela surpresa geral, tomaram sentido ignorado (na direção dos brejos e matos). Estas pareciam conhecer e querer distância da exploração humana. A alternativa consistia em procurar voar com as próprias asas. As abelhas esforçaram-se pela autóctone sobrevivência e felicidade. Algumas poucas abelhas, com aparência de desnorteadas e perdidas, ficaram para trás. Elas, com sua coragem e ousadia, cedo certamente acharão a companhia das antigas companheiras.
O criador, para abafar a curiosidade e satisfazer a obsessão, foi conferir e  repassar as diversas iscas. Uma tremenda decepção e frustração diante da excepcional esperteza e sabedoria. A solução foi pensar na alegria e satisfação alheia e, lá adiante, receber um enxame filho, como dádiva, nalguma isca. O alívio de consciência relacionou-se ao ganho de impresvistas comunidades. Esta, de um momento a outro, afluíram as caixas e fizeram as graças.
Um morador, na proporção de extrair dividendos dos investimentos, precisa dar um grito de alegria e satisfação. Este, na proporção de abrir as sobrecaixas das colmeias, surpreende-se com o especial trabalho desses singelos insetos. Outro, como aposentado, cercou sua residência com habitadas caixas. Este, em meio ao tradicional chimarrão, assenta-se no pátio e vislumbra a labuta dos bichinhos. As idas e vindas, nas atitudes e comportamento, revelam os estados das comunidades e ninhos. As histórias e relatos, sobre a espécie, não faltam no cotidiano dos meios coloniais.
Abelhas revelam-se umas contínuas surpresas e daí os criadores cedo criam uma obsessão pelo seu trabalho. O cidadão, nas inúmeras situações, não tem como angariar a totalidade das chances. Os enganos e perdas assim como as conquistas e vitórias acompanham o cotidiano da vida. A organização social dos insetos dá inveja as sociedades humanas.

Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”

Crédito da imagem: http://blogbioartropodes.blogspot.com.br 

segunda-feira, 11 de março de 2013

Debaixo do nariz


Uma família, depois de um suado e trabalhado ano, foi tirar as devidas e merecidas férias. O local escolhido ostentava-se uma conceituada praia. Estas folgas, planejadas e sonhadas a um bom tempo, tiveram o devido cuidado com os detalhes financeiros. Alguma reserva, em forma de dinheiro vivo, foi carregado na bagagem. O objetivo, num primeiro momento, consistia em abster-se de correr e procurar alguma agência bancária/caixa eletrônico para saques.
A família, de quatro membros, achegou-se a casa pré-alugada. Os materiais, em forma de bagagem, foram descarregadas do veículo. A ânsia e a pressa, de imediato, foi correr na direção das águas do mar. Os membros queriam usufruir do devido e merecido banho. Este almejado e imaginado a uns bons meses. O intenso calor, do momento da viagem, ainda reforçaram as necessidades e pretensões  O genitor, como pessoa tarimbada pela sabedoria da vida, manteve uma apressada e singela cautela e precaução.
Os “espertalhões e malandros”, disseminados e a espreita nos inúmeros espaços, ficaram de tocaia (diante dum eventual cochilo alheio). Visitantes novos, dinheiro na certa, como medida de precaução contra imprevistos. Um trio, com um elemento dando cobertura a transgressão, foram vasculhar o interior da residência pré-alugada. Os invasores, de forma minuciosa, viraram e reviraram os bens e materiais alheios. Estes, na afobação e pressa, devassaram o ambiente e nada do almejado dinheiro aparecer. O forasteiro deveria carecer deste ou guardá-lo nalgum  lugar excepcional. O espaço, nos cantos e recantos do cubículo, foram vasculhados e nada. Quê frustração e risco aos oportunistas!
O cidadão, como camarada astuto e esperto, tinha guardado o numerário num lugar impensado. Este, como artimanha e precaução, tinha espalhado o dinheiro debaixo dum tapete (da entrada da porta frontal). Os larápios, apressados e agitados, pisaram e repisaram nas notas, porém deixaram de localizá-las no descuido e inexperiência. Estes esqueceram-se de averiguar o lugar óbvio.
A felicidade de uns é a infelicidade de outros. A generalizada impunidade incentiva a malandragem. O excesso de malandros leva a escancarada roubalheira. A pilhagem, sob diversas formas cobertas ou veladas, parece impregnada no gênero humano. Os lugares menos imaginados costumam ser os mais seguros.

Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano da Existência”

Crédito da imagem: http://produto.mercadolivre.com.br

domingo, 10 de março de 2013

O debulhador de milho


Um jovem, advindo das colônias, conheceu uma menina da cidade. Estes, em função da educação diferenciada, tiveram acentuadas diferenças culturais e filosóficas. Os coloniais, diante dos modelos urbanos de existência, tem poucas chances de estabelecer relacionamentos duradouros e íntimos. O modelo de sobrevivência, com a massiva labuta (bruta e física), contrasta com a realidade do trabalho urbano (das tarefas mais leves e intelectualizadas).
Um jovem e uma moça, num destes bailes das colônias, dançaram umas e outras boas marcas. Os dois, num acerto de habilidades, revelaram-se “belos arrasta pés ou excepcionais pés de valsa”. A dança e a música, como diversão e passatempo, ostentava-se uma afeição e paixão (como opção de lazer e prazer). Agrada aqui e acolá; carinho lá e cá foram uma realidade entre a parceria. O fogo da paixão, no sabor da animação e bebedeira, tomaram conta dos aparentes enamorados (“nesta história do fica/finca”).
O moço, nos chega para cá e beijinhos prá lá, atiçou-se nos desejos íntimos. Este, numa altura do embalo (duma marca romântica), desabafa: “- A minha espiga de milho encontra-se bastante atiçada e irrequieta no interior da calça!” A jovem, sentido a malícia das conversas e encostos,  quis safar-se das intensões e pretensões amorosas. O rapaz, numa dessas linguagens de metáfora,  reforçou o escamoteado pedido: “- Esta espiga precisa conhecer algum jeito  de ser debulhada nessa noite!” A moça, em meio a despretensão e franqueza, rebateu: “- Esta debrulhação, no entanto, não será com minha máquina de tirar grãos!”
Poucas e efetivas palavras abreviam uma porção de ladainhas. As figuras de linguagem são uma forma de dizer muito em singelas palavras. Uns relacionamentos, sem o correspondente fogo da paixão, não tem maiores chances de êxito e satisfação. As meninas, nas colônias, são sementes preciosas e raras. Quaisquer moças sentem-se como rainhas num conjunto de pretendentes. As escolhas refinadas encontram-se difíceis em meio as escassas opções.

Guido Lang
“Singelas Histórias do Cotidiano das Colônias”

Crédito da imagem: http://amicaphilosophiae.blogspot.com.br